Com painéis sobre mediação, conciliação e justiça restaurativa, o sistema de Justiça foi o tema principal dos debates da tarde desta quinta-feira (8) no IV Congresso Nacional de Direito e Fraternidade e no I Congresso do Instituto Brasileiro de Educação em Direitos e Fraternidade (IEDF), que se realizam no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Carlos Augusto Alcântara Machado, professor universitário e procurador do Ministério Público de Sergipe, abordou o tema “O Resgate da Fraternidade no Sistema de Justiça”. Ele falou sobre o constitucionalismo do futuro, ou constitucionalismo fraternal. “Todos passam a ser responsáveis não somente pela construção de uma sociedade voltada à formação de cidadãos, mas uma sociedade de irmãos”, declarou.
Para o procurador, “a fraternidade, em uma visão exclusivamente jurídica, inicialmente passou a ser estudada como valor, mas já nos encaminhamos e começamos a realizar estudos mais sólidos e profundos para apresentá-la no sentido normativo e, por conseguinte, vinculante, na qualidade de direito e dever, assim como ocorre com os direitos à igualdade e liberdade. Há um caminho a ser seguido. O legislador constituinte destacou como um dos fundamentos a dignidade da pessoa humana, e será exatamente por meio dessa garantia que a fraternidade será alcançada”, explicou.
A presidente da mesa, juíza federal Marcela Brandão, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, destacou que o “interessante do direito comparado é entender que estamos caminhando juntos, que a humanidade transcende todas as fronteiras”.
A professora Maria Giovanna Rigatelli, da Universidade de Sofia, na Itália, falou sobre a visão da humanidade como família. “As regras são muito excessivas, não facilmente compreensíveis. Diante de normas injustas, cabe ao indivíduo tomar posição para dar a sua contribuição à Justiça”, declarou.
Para a professora, “a essência da fraternidade requer, pela sua própria natureza, a relação, e torna-se o princípio orientador que, diferentemente da liberdade e da igualdade próprias de cada pessoa, vive em um espaço intersubjetivo, como meio e possibilidade para a partilha. Este é também o modo de tornar possível e gerar o espaço de diálogo”.
A doutora Endy Moraes, da Fordham University, dos Estados Unidos, discorreu sobre o estudo da integração de valores de fé no contexto da prática jurídica. Segundo ela, o instituto que coordena em Nova York pretende promover um diálogo aberto sobre questões relacionadas às leis e às religiões.
Sistema de Justiça
O ministro do STJ Reynaldo Soares da Fonseca coordenou os painéis, que contaram com a mediação da desembargadora federal Gilda Maria Sigmaringa Seixas, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. A desembargadora apresentou o primeiro painel, sobre mediação e conciliação, com participação das juízas do Tribunal de Justiça do Distrito Federal Magáli Dellape Gomes e Gláucia Foley e da defensora pública Célia Symone Gonçalves, do Pará.
Gláucia Foley tratou da mediação comunitária e da cultura do diálogo, cujo objetivo é transformar cada cidadão em agente de promoção da justiça e da paz. “A justiça comunitária é realizada na comunidade, para a comunidade e pela comunidade. A ideia fundante é a ideia de que, para construirmos uma nação de justiça e de paz, precisamos democratizar a Justiça, e isso vai muito além de apenas assegurar acesso universal dos cidadãos ao Poder Judiciário. A justiça como valor vai muito além dos juízes e dos tribunais”, afirmou.
Segundo a magistrada, a grande quantidade de processos no Brasil traz uma falsa percepção de amplo acesso à Justiça. “A Justiça para ser radicalmente democrática, eticamente inclusiva e construir efetivamente a paz, precisa ser uma Justiça participativa e que ultrapasse os muros dos nossos palácios de Justiça”, declarou.
Magáli Gomes abordou o resgate da cultura do diálogo, trazendo o viés da fraternidade para as relações familiares. Explicou que conflitos podem ser transformados em soluções e trouxe alguns recursos utilizados por ela na vara de família, a partir de técnicas de comunicação não violenta. “Quando falamos em conflitos familiares, temos que mudar a comunicação. Quando mudamos a forma da comunicação, começamos a perceber e mudar o foco. Isso leva o Judiciário a entender o sentimento e a necessidade que está por trás dos conflitos.”
Célia Symone Gonçalves, por sua vez, apresentou um novo olhar para o direito, destacando o alcance da boa comunicação nesse resgate da cultura do diálogo. Segundo ela, a demanda que versa sobre direitos disponíveis é judicializada porque faltou diálogo, comunicação e conscientização. “Temos um vasto conhecimento, mas quando estamos em conflito é difícil dialogar. É difícil porque a tendência é se tornar uma pessoa reativa. Temos que ter uma visão sistêmica, compreender as partes e o todo.”